O Espiritismo e a Ressurreição de Lázaro


Pr. Airton Evangelista da Costa




        A PALAVRA OFICIAL do Espiritismo sobre a ressurreição de Lázaro é a seguinte:

        “Há, pois, toda a probabilidade de que, nos dois exemplos acima citados [o filho da viúva de Naim e a filha de Jairo] apenas houve síncope e letargia... Dado o poder fluídico que possuía Jesus, nada há de espantoso que o fluído vivificante, dirigido por uma forte vontade, haja reanimado os sentidos entorpecidos; e mesmo que ele tenha podido voltar ao corpo o Espírito prestes a deixá-lo, enquanto o liame perispiritual não estivesse definitivamente rompido. Para os homens daquele tempo, que julgavam estar o indivíduo morto, desde que não respirasse mais, houve ressurreição... porém, houve na realidade cura, e não ressurreição, na acepção da palavra. A ressurreição de Lázaro, digam o que disserem, não invalida de modo nenhum esse princípio. Diz-se que ele já estava há quatro dias no sepulcro; mas sabe-se que há letargias que duram oito dias, e mesmo mais. Acrescenta-se que ele cheirava mal o que é um sinal de decomposição. Essa alegação não prova nada, visto que em certos indivíduos há decomposição parcial do corpo, mesmo antes da morte, e exalam odor de apodrecimento. A morte não chega senão quando os órgãos essenciais à vida são atacados. E quem podia saber se ele cheirava mal? É sua irmã Marta que o diz; mas como sabia? Lázaro se achava enterrado há quatro dias, ela supunha isso, mas não podia ter certeza” (A Gênese, Allan Kardec, Cap XV, n. 39 e 40).

        Allan Kardec trabalhou em cima de probabilidades ao afirmar que Lázaro fora enterrado vivo. Os homens daquela época até poderiam se enganar, mas Jesus tinha certeza de que Lázaro estava morto. O relato bíblico contraria as conclusões de Allan Kardec. Vejam:


(1)
Então Jesus disse-lhes claramente: Lázaro está morto;” (Jo 11:14 ACF)


Perdão pela redundância, mas se Jesus disse que Lázaro estava morto é porque Lázaro estava de fato morto. Quem além de Jesus poderia dar um diagnóstico preciso? Seria o caso de quase dois mil anos depois o Espiritismo apresentar versão diferente?

(2) Jesus disse a Marta:
“... Teu irmão há de ressuscitar.” (v.23).

Ressuscitar significa voltar a viver. Kardec sabia disso ao dizer, como acima, “porém, houve na realidade cura, e não ressurreição, na acepção da palavra”. Jesus estava falando exatamente de ressurreição.

(3) Disse Jesus:
“... Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que esteja morto, viverá;(v.25). Se fosse apenas uma letargia, por que Jesus enfatizou que a irmã de Lázaro “veria a glória de Deus”? (v.40). Para curar um homem de letargia precisaria invocar a glória de Deus? Essa declaração, todavia, indicava que Marta estava prestes a presenciar um grande milagre. Além disso, a Bíblia registra que “o defunto saiu” do sepulcro (v. 44). Segundo o Dicionário Aurélio, defunto quer dizer “pessoa que morreu; morto”.

Agora ouçam o seguinte. Para o kardecismo, Jesus foi:

(a) Um espírito muitíssimo evoluído que atingiu o mais elevado grau de perfeição.
(b) "Um iniciador da mais pura, da mais sublime moral evangélico-cristã, que há de renovar o mundo, aproximar os homens e torná-los irmãos...”.
(c) Um homem que veio ensinar a JUSTIÇA de Deus;
(d) Um homem que veio ensinar TODAS AS VERDADES, porque "no Cristianismo se encontram todas as verdades".
(e) Jesus foi “A Segunda Revelação de Deus”; a Primeira, Moisés; a Terceira e última, o Espiritismo (O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, Introdução e cap.I).

Diante de tantas qualidades morais e espirituais atribuídas pelo Espiritismo a Jesus, não há como admitir que Ele tenha proferido alguma palavra mentirosa. Se mentiu em alguma coisa; se não levou a sério o Seu ensino; se ensinou alguma coisa errada, então nunca foi um “Bom Espírito”, um Espírito puro. Se não confiarmos na “Segunda Revelação de Deus”, como confiaríamos na “Terceira Revelação”, o Espiritismo? 

Daí porque o Espiritismo deveria observar com muito cuidado as palavras de Jesus, tudo o que Ele disse, todas as verdades contidas no Seu Evangelho. Daí porque devemos também, nós evangélicos, em nossa conversa com os espíritas, fazê-los lembrar dessas premissas, do entusiasmo com que Kardec falou de Jesus e da imperiosa necessidade de levar em consideração tudo o que Ele falou.



Lázaro está morto


Feitas essas considerações, passemos ao caso de Lázaro. Vejamos o relato bíblico, segundo João 11.1-44.

“14 Então Jesus disse-lhes claramente: Lázaro está morto ... 17 Chegando, pois, Jesus, achou que já havia quatro dias que estava na sepultura ... 21  Disse, pois, Marta a Jesus: Senhor, se tu estivesses aqui, meu irmão não teria morrido. ... 23  Disse-lhe Jesus: Teu irmão há de ressuscitar. 24  Disse-lhe Marta: Eu sei que há de ressuscitar na ressurreição do último dia. 25 Disse-lhe Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que esteja morto, viverá; ... 27  Disse-lhe ela: Sim, Senhor, creio que tu és o Cristo, o Filho de Deus, que havia de vir ao mundo.”

Perguntou Jesus [referindo-se ao cadáver de Lázaro]: 34  E disse: Onde o pusestes? ... 39  Disse Jesus: Tirai a pedra. Marta, irmã do defunto, disse-lhe: SENHOR, já cheira mal, porque é já de quatro dias. 40  Disse-lhe Jesus: Não te hei dito que, se creres, verás a glória de Deus?” Após uma breve oração, Jesus clamou em alta voz: “39 Lázaro, sai para fora. 44  E o defunto saiu, tendo as mãos e os pés ligados com faixas, e o seu rosto envolto num lenço ...


Jesus soube primeiramente que Lázaro estava enfermo (Jo 11.3), mas passados alguns dias Jesus revelou aos discípulos que ele havia morrido. Jesus foi o primeiro a saber da morte de Lázaro, confirmada depois por Marta, Maria, e pelos judeus ali presentes (Jo 11. 21, 32, 37).

Ora, quando o Espiritismo afirma que Lázaro não morreu, mas que sofrera uma síncope, e, por ignorância da época, fora enfaixado e colocado vivo no sepulcro, faz uma afirmação inconseqüente.

Vejam mais o que escreveu o codificador da doutrina espírita sobre o assunto:

“A reencarnação fazia parte dos dogmas dos judeus, sob o nome ressurreição... Criam eles que um homem que vivera podia reviver, sem saberem precisamente de que maneira o fato poderia dar-se. Designavam pelo termo ressurreição o que o Espiritismo, mais judiciosamente, chama de reencarnação. Com efeito, a ressurreição dá idéia de voltar à vida o corpo que já está morto, o que a Ciência demonstra ser materialmente impossível, sobretudo quando os elementos desse corpo já se acham desde muito tempo dispersos e absorvidos. A reencarnação é a volta da alma ou Espírito à vida corpórea, mas em outro corpo especialmente formado para ele e que nada tem de comum com o antigo. A palavra ressurreição podia assim aplicar-se a Lázaro...” (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec, cap IV, item 4).

Concordo com Allan Kardec quando diz que a ressurreição dá idéia da recomposição corpo-espírito (“voltar à vida o corpo que está morto”). Concordo também com o que diz sobre reencarnação, segundo o ensino espírita (“volta do espírito em outro corpo”). Concordo também quando diz que o conceito de ressurreição se aplica a Lázaro. E então? A palavra de Jesus é incontestável. Ele declarou que Lázaro estava morto. Depois, já cheirando mal o cadáver, Ele o fez reviver. Logo, Lázaro ressuscitou. Certo como dois mais dois são quatro. Jesus, o Filho de Deus, passou por cima da Ciência. A mesma coisa aconteceu quando caminhou sobre as águas, quando transformou água em vinho, quando multiplicou pães, quando fez reviver o filho da viúva de Naim e a filha de Jairo, quando curou paralíticos, cegos, leprosos.

        O Espiritismo não pode admitir a ressurreição de Lázaro pelos seguintes motivos: (a) admiti-la implicaria em aceitar também a ressurreição corporal de Jesus, (b) em acatar as demais ressurreições bíblicas, (c) e em admitir a possibilidade de uma ressurreição coletiva na Segunda vinda de Jesus (1 Ts 4.16-17). As evidências dessas ressurreições e a promessa de uma ressurreição coletiva na volta de Jesus colocam em xeque-mate a crença reencarnacionista, coluna vertebral do kardecismo. Na reencarnação o espírito volta em outros corpos; na ressurreição, o espírito retorna ao corpo original.

A ressurreição de Lázaro é o que há de mais claro na Bíblia, e tem uma história: Lázaro ficou enfermo; faleceu; foi colocado no jazigo, onde passou quatro dias; sua irmã Marta disse que o corpo estava em estado de decomposição, pois “já cheirava mal”. Além disso, temos o atestado de óbito do insuspeito Jesus, que declarou com todas as letras: LÁZARO ESTÁ MORTO (Jo 11.14). A Bíblia diz que essa afirmação de Jesus foi de forma clara.

O inconsistente argumento segundo o qual Lázaro sofrera de um ataque epilético não pode prevalecer. Se válido tal raciocínio, deveríamos considerar que os judeus não faziam a menor diferença entre um corpo vivo e um corpo morto. Teríamos de negar as seguintes ressurreições e admitir que essas pessoas estavam vivas, e que, nos casos a seguir, Jesus, Elias, Eliseu, Pedro e Paulo ressuscitaram quem não havia morrido:

O filho da viúva de Serepta, ressuscitado pelo profeta Elias (1 Rs 17.19-22); o filho da sunamita, ressuscitado pelo profeta Eliseu (2 Rs 4.32-35); a filha de Jairo, por Jesus (Mc 5.21-23, 35-41); o filho da viúva de Naim, por Jesus (Lc 7.11-17); a discípula chamada Tabita, por Pedro (At 9.36-43); uma ressurreição coletiva logo após a morte de Jesus (Mt 27.52); a ressurreição do jovem Êutico, pelo apóstolo Paulo (At 20.9).
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